Nas areias escaldantes dos desertos norte-americanos, o monstro-de-gila (Heloderma suspectum), um lagarto de escamas vibrantes e mordida venenosa, esconde um paradoxo científico. Apesar de seu veneno ser perigoso — como evidenciado pela morte de um homem no Colorado, EUA, em 2024, após ser mordido por seu animal de estimação —, pesquisadores descobriram nele a exendina-4, molécula que revolucionou o tratamento de diabetes tipo 2 e obesidade. Presente em medicamentos como Ozempic e Wegovy, essa enzima age no receptor GLP-1, responsável por regular o açúcar no sangue e a saciedade, mas com uma vantagem crucial: sua duração no organismo é muito maior que a do GLP-1 humano.
A chave está na adaptação do próprio réptil. Estudos da Universidade de Queensland revelaram que a exendina-4 permite ao monstro-de-gila sobreviver com apenas seis refeições anuais, desacelerando seu metabolismo. Ao sintetizar uma versão artificial da molécula, cientistas criaram fármacos que imitam esse efeito, prolongando a ação do GLP-1 no corpo. Isso não só melhora o controle glicêmico, como reduz o apetite, tornando-se aliado contra epidemias globais como a obesidade.
Ironia da evolução, o veneno que evoluiu para imobilizar presas tornou-se fonte de esperança para milhões. Enquanto o lagarto segue seu ritmo lento sob o sol do deserto, seu legado científico acelera a medicina moderna, provando que até nas criaturas mais improváveis residem respostas para os desafios da humanidade.